domingo, 12 de fevereiro de 2012

valter hugo mãe

Quis alguém que eu fosse estranha. E a prova disso é que poucas coisas me resultam tão sedutoras como alguém que escreve bem. Alguém que vira, revira, usa, inventa e domina a língua. A minha, sobretudo, porque as outras são actores secundários. Como todas as paixões dignas desse nome, deixa-me entalada entre a vontade de partilhar a descoberta e o desejo egoista de a guardar só para mim para que não a gaste quem não a merece. Mas depois lemos coisas que nos enchem tanto que parece que a nossa caixinha não tem volume para a guardar só para nós. valter hugo mãe, casa comigo.

"porque a sua morte me aterroriza. não passa, américo, não passa. a morte dela não passa. o américo esperou uns segundos por que me acalmasse. procurou um silêncio limpo como uma folha muito limpa onde pudesse escrever uma frase mais digna e disse, um dia essa saudade vai ser benigna. a lembrança da sua esposa vai trazer-lhe um sorriso aos lábios porque é isso que a saudade faz, constrói uma memória que nós nos orgulhamos de guardar, como um troféu de vida. um dia, senhor silva, a sua esposa vai ser uma memória que já não doi e que lhe traz apenas felicidade. a felicidade de ter partilhado consigo um amor incrível que não pode mais fazê-lo sofrer, apenas levá-lo à glória de o ter vivido, de o ter merecido. tenho até inveja de si, senhor silva, porque eu tenho trinta e um anos e estou por aqui solteiro, já não vou a tempo de ter cinquenta anos de uma grande paixão."


A máquina de fazer espanhóis, valter hugo mãe



4 comentários:

jonah disse...

é isso...

macaca grava por cima disse...

se o VHM aceitar o teu pedido, que tenham uns belos (mesmo que curtos) anos de paixão pela frente ;-)

ando mesmo curiosa para ler alguma coisa deste senhor...

macaca disse...

Cada página supera a anterior. É um livro arrebatador e ele é sem dúvida o meu escritor português preferido. Estou a chegra ao fim e já a pensar no que vai ser da minha vida sem o Silva...

macaca grava-por-cima disse...

ahhh... e tu não és estranha! bj